A casa onde a menina Sophia de Jesus Ocampo, de 2 anos, morava e foi morta está em estado insalubre e cheia de lixo. Localizada na região norte de Campo Grande, a residência estava em situação de abandono, com roupas penduradas no varal, brinquedos jogados no chão e fezes de animais espalhadas pela varanda.
A menina chegou morta à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Bairro Coronel Antonino, na noite dessa quinta-feira (26). Segundo as investigações, a criança apresentava sinais de estupro e espancamento.
Na casa onde a criança morava, bitucas e caixas de cigarro foram encontradas espalhadas na varanda da casa. Garrafas de bebidas alcoólicas também foram vistas.
Além disso, brinquedos da menina ficaram espalhados pelo chão da varanda, próximo à lavanderia e até no varal.
O odor da residência é forte. As roupas no varal se misturam com o cenário de completo abandono. Bancos de madeira e sofás sujos ainda estão expostos a quem passa pela rua, na varanda da residência.
O local passou por perícia técnica, que tenta descobrir mais detalhes do crime que chocou moradores de Campo Grande.
Dia da morte
Segundo a avó da menina, uma professora de 48 anos, a criança estava passando mal e vomitando, desde o início da manhã de quinta-feira (26), dia em que morreu.
No dia, Sophia estava sendo cuidada pela mãe, Stephanie de Jesus Dada Silva, de 24 anos, e chegou a ter uma melhora no início da tarde. No entanto, a criança voltou a piorar por volta das 17h.
Ela foi levada pela própria mãe à UPA do bairro Coronel Antonino, mas chegou no local sem vida. Segundo informações da polícia, a criança já estava morta havia cerca de quatro horas quando deu entrada na unidade.
Ainda segundo a avó, a neta tinha hematomas nas costas, na boca, teve sangramento pelo nariz e apresentava abdômen inchado, indicando uma possível hemorragia interna.
Prisão em flagrante
A mãe, Stephanie de Jesus Dada Silva, e o padrasto, Christian Campoçano Leitheim, foram presos em flagrante na quinta-feira (26) pelo crime de homicídio qualificado por motivo fútil.
Já neste sábado (28), o juiz Carlos Alberto Garcete, da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Campo Grande, converteu, durante audiência de custódia, a prisão dos suspeitos de temporária em preventiva.
O padrasto foi levado para a Penitenciária Estadual Masculina de Regime Fechado da Gameleira. A mãe foi transferida para um presídio no interior do estado, por motivos de segurança.
30 atendimentos em postos de saúde
A polícia também identificou que a menina foi atendida na rede pública de saúde mais de 30 vezes. Em uma das idas à unidade, a pequena estava com fratura na tíbia, mas o caso sequer foi avisado à polícia.
“Não pelo número de vezes, mas quando a criança chega lá com sinais de violência, é obrigação deles encaminhar à polícia se houver qualquer suspeita de alguma coisa”, afirmou a delegada Anne Karine Trevizan, titular da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA)
Em resposta ao número de atendimentos a Secretaria Municipal de Saúde (Sesau) negou que os funcionários identificaram violência. “Nos atendimentos não foram identificados sinais de agressão”.
Denúncia de agressão
Ainda conforme a delegada Anne Karine, as agressões em Sophia foram denunciadas por duas vezes: uma em março e outra em novembro. Durante as investigações, foi constatado que a menina era vítima do padrasto. Os casos foram enviados ao Judiciário.
A situação de Sophia também já havia sido denunciada ao Conselho Tutelar. A conselheira responsável pelo caso revelou que, em maio, o pai da menina procurou ajuda, contou que a filha passava fome e era agredida e que, por isso, queria a guarda dela. Na época, as equipes foram ao local.
“O poder investigativo é da polícia, a gente não consegue fazer investigação, vamos na residência, fazemos visita. A denúncia é que a criança não tinha alimentação e estava com hematomas, mas não foi isso constatado pela técnica, que chegou e viu a criança bem, sem hematomas, com alimentação, não tem como tirar a criança de lá.”
Ainda de acordo com o Conselho Tutelar, o caso foi registrado em maio na delegacia, mas as testemunhas sequer foram chamadas para prestar depoimento.
Pedido de guarda escancara homofobia
Igor de Andrade, companheiro do pai da menina, relatou que eles tentaram conseguir a guarda da criança, mas um dos impedimentos seria a homofobia por parte da mãe da vítima.
“Ela dizia que não deixaria a filha com dois homens”, contou.
Igor ainda relatou que as visitas à menina só foram possíveis depois que o pai da criança entrou na Justiça. Ainda assim, segundo Igor, o pai só via a filha do jeito que a mãe determinava.
“Passamos por vários lugares para entrar com pedido de guarda da neném. A única coisa que a gente pedia era pra tirar a menina de lá. A mulher [mãe] chegou a ser presa no ano passado por maus-tratos aos animais. Com isso, fomos atrás novamente para mostrar a situação insalubre que a neném vivia, e aí, vinha a mesma resposta: ‘tem que aguardar’”, disse Igor.
Dois boletins de ocorrência chegaram a ser registrados por maus-tratos, devido ao estado em que a menina chegava à casa do pai. Em uma das ocasiões, a criança chegou com a perna quebrada, e o pai foi informado que ela tinha caído e se machucado.
Ainda conforme Igor, uma audiência sobre os casos foi marcada, mas a mãe não compareceu.