Se a fé prevalece na política, então as ansiosas conjecturas dos liderados do prefeito Marquinhos Trad (PSD) precisam ser calçadas por uma garantia que os céus ainda não puderam dar.
Não se pode duvidar do ardor e da admirável convicção com que o gestor campo-grandense submete o seu futuro político e eleitoral à vontade de Deus – entretanto, esse tipo de destino não é de pertencimento único, tendo em vista que o Deus desta fé é o mesmo de outros eventuais garimpeiros que concorrem com o prefeito na sondagem futurista sobre seus destinos, entre os quais André Puccinelli (MDB), Eduardo Riedel (PSDB) e José Orcírio dos Santos, o Zeca do PT.
Deus não é cabo eleitoral, não vota e nem escolhe candidaturas – limita-se, de acordo com suas santas atribuições, a abençoar todos aqueles a quem deu a vida. Os destinos ficam sob a responsabilidade de cada um. Nesse caso, então, reserva-se aos competidores da próxima disputa eleitoral em Mato Grosso do Sul encontrar suas próprias fórmulas e estratégias para fazer o jogo sucessório.
Será um exercício temerário e inócuo fazer uma reflexão conclusiva sobre quem dentre esses quatro teria a vantagem na largada para 2022 e, em consequência, no desenrolar do jogo. Um ponto de partida a ser considerado para tal análise está nas pesquisas de avaliação de desempenho político-administrativo e das intenções de voto.
ANDRÉ PUCCINELLI – Em princípio, a fotografia das amostragens sobre tendências do eleitor neste momento aponta o ex-governador André Puccinelli com a maior taxa de preferência em relação aos demais. Na média, porque já têm pesquisas para todos os gostos, ele lidera até com relativa folga. No entanto, a sua candidatura ainda é uma incógnita. Embora tenha assumido a intenção, inclusive com uma página de pré-candidato nas redes sociais, o emedebista carrega a pesada carga de questionamentos morais e políticos decorrentes das denúncias que o Ministério Público lançou no caso “Lama Asfáltica”.
Puccinelli não é réu, porém é alvo de incômodas e desgastantes acusações desde o último dia de seu segundo mandato de governador, em 2014. Isso pesa. E muito.
RIEDEL – No caso de Eduardo Riedel, os prós que sobram em seu perfil técnico e na impecável folha corrida ainda não reforçam no perfil político e eleitoral. Para potencializar a condição de garimpeiro de votos, precisará descobrir meios e um chão mais eficiente para percorrer. Até agora, as pesquisas andam sinalizando que o fato de ser ungido pela Governadoria não facilita o tráfego pelas vias eleitorais – ao contrário, podem até torná-lo mais difícil.
Há tempo, mas não tanto quanto seria necessário para Riedel amadurecer no imaginário do eleitor como a pessoa que as urnas crismariam como continuador da aprovada performance de Reinaldo Azambuja no governo. E aí um dos itens para a receita dessa candidatura: fazer com que uma gestão de sucesso reconhecido pelos indicadores gerenciais e econômicos do país neutralize o contrapeso da avaliação pessoal que setores engajados fazem sobre seu governante estadual.
JOSÉ ORCÍRIO – Quanto a Zeca do PT, já em estado latente de pré-candidatura, o cenário que se projeta o desaconselha a ter esperanças seguras de êxito. O partido já não tem o mesmo encanto de antes e os revezes eleitorais tiram muito do oxigênio que havia quando a inserção popular e social era mais encorpada. Desde 2006, quando Zeca fechou seu segundo mandato de governador, o PT vem perdendo espaços em todas as instâncias de representação política e popular no Estado.
A luz de seu túnel traz um alento, é verdade, com a baixa do ciclo bolsonarista e a quase ressurreição política de Lula. Todavia, isso ainda não significa transferência de prestígio para dar peso competitivo na sucessão estadual. Zeca é nome forte, sabe fazer o jogo de confronto e no páreo a ser travado nas ruas é dos mais competentes. Resta saber até onde vai seu alcance eleitoral.
MARQUINHOS TRAD – A devoção de Marquinhos é elogiável. Mas não é ela que deverá guiar sua decisão. Inteligente, deve reconhecer que segue a um Deus que é Pai também dos concorrentes e não faz acepção. Portanto, decidir sobre candidatura ao Governo implica, antes de tudo, sopesar riscos, vantagens e desvantagens, metas a curto, médio e longo prazo.
Está em suas mãos, entre outras coisas, avaliar conclusivamente, e desde já, se está disposto a renunciar à prefeitura em abril, seis meses antes das eleições, e entregar a titularidade do cargo à vice-prefeita Adriane Lopes (Patriota). Além disso, verá diante de si uma situação constrangedora se tiver de enfrentar Eduardo Riedel, candidato do governador a quem se comprometera a retribuir em igual tom o apoio que recebeu para se reeleger prefeito em 2020.
Marquinhos deve estar ouvindo aqui e ali chamados do tipo “a hora é esta”. É uma provocação impulsionada por alguns ingredientes de estímulo. Um deles é o calendário: se ficar até o fim do mandato na prefeitura, em 2024, será obrigado a esperar até 2026, quando já terá vivido dois anos no “sereno”, sem mandato e sem as franquias afetivas, políticas e litúrgicas das relações que se estabelecem quando a caneta do poder está à mão.
Outro chamado provocativo e estimulante é a constatação da probabilidade matemática oferecida pelas pesquisas, que na média atribui ao prefeito de Campo Grande uma aprovação superior a 50% e cerca de 30% dos votos na capital. Ora, um terço dos campo-grandenses aptos a votar equivalem a aproximadamente 205 mil eleitores, fatia considerável e decisiva no caso de disputas estaduais.
Por fim, uma última e irresistível condição para Marquinhos levantar seu voo seria ter Puccinelli fora da disputa e Riedel patinando nas pesquisas. A primeira hipótese se torna mais provável, tendo em vista o empenho redobrado de Reinaldo Azambuja para alavancar o avanço de seu pupilo, a quem confiou o primeiro plano de protagonismo no lançamento e na inauguração das obras de infraestrutura que o governo vem realizando nos 79 municípios.